domingo, 5 de junho de 2011

Soulmates Never Die ~ 8º capítulo

Pestanejei. Olhei para o meu lado esquerdo e fiquei desapontada, pois não vi quem esperava ver. Levantei-me e fui abrir a janela. Dei uma olhadela ao espelho, ajeitei o cabelo para trás das costas e saí do quarto.
Sobressaltei-me ao começar a ouvir a música Volare dos Gipsy Kings.
Encaminhei-me até à cozinha, pois o som provinha de lá.
Vi o Espanhol a procurar algo para comer.
- Posso ajudar?
- Oh. Hola. Te desperté? Perdóname.
- Não, já dormi o suficiente. Passas a vida a dizer-me “perdóname” – informei-o, emitando o seu sotaque tão latino.
Ele sorriu.
- Perdóname.
- Estás a ver?!
Ele riu-se.
- Gostas de cereais de chocolate?
- Sí.
Procurei no armário os meus cereais de eleição.
- Será que gostas destes? Acredita que são muito bons.
O Espanhol olhou para a caixa dos Crush.
- Son mis favoritos. – disse, espantado.
- A sério? Também os meus.
Sorri-lhe, enquanto encontrava duas tacinhas amarelas para pôr os cereais.
Comemos rápido e, despachámo-nos a fim de voltarmos ao Hospital.
Entrámos no Hospital e dirigimo-nos à recepção.
- Boa tarde. Somos amigos do André Santos, podemos vê-lo?
- Peço imensa desculpa, mas agora é impossível. O doente teve um acidente. – disse a rapariga de cabelo castanho, com os ocúlos a caírem-lhe pelo nariz. Franzi as sobrancelhas, confusas.
- Como assim “acidente” ?
- O Sr. Santos foi fazer um RAIO-X ao joelho direito e, enquanto se encaminhava para a sala de exames, a sua perna perdeu as forças e caíu.
- CÓMO?! – inquiriu o Espanhol ao não querer acreditar.
- O pior, é que bateu com a cabeça no chão. Os médicos estão a averiguar se tem ou não traumatismo crâniano.
Fiquei paralisada. O Espanhol apertou-me o ombro, esperando a minha reacção. Finalmente, explodi.
- Como pôde isso acontecer?! Ele foi sozinho?
- Não, mas...
- Com uma lessão no joelho, não devia andar numa cadeira de rodas nos deslocamentos para os exames?
- Sim, mas o Sr. Santos insistiu várias vezes para ir pelo seu próprio pé, de modo a ver a gravidade da lessão.
- DEVIA TÊ-LO OBRIGADO! – berrei para a recepcionista, atrapalhada.
- Cálmate, Mariza. Cálmate.
- Não me peças para ter calma, Javi! O André tem traumatismo crâniano. Pode inclusivé entrar em estado de coma!
- Os médicos estão a fazer todos os possíveis para que tal não aconteça. – disse a rapariguinha.
O Espanhol agarrou em mim e dirigiu-nos à sala de espera.
Não me consegui sentar; andava de um lado para o outro a barafustar baixinho.
- Eu não acredito nisto! Eu não acredito nisto! – repetia eu sem cessar.
- La culpa es mía.
- Não é nada! Não digas isso! A culpa é dos médicos. Mas onde é que já se viu: um doente a não querer andar de cadeira de rodas e os médicos fazem-lhe as vontadinhas todas?!
Finalmente, sentei-me. Passados uns dez minutos, uma enfermeira veio à sala de espera.
- Mariza Ventura? – chamou.
- Sou eu. – disse ao levantar-me.
- Precisamos da sua ajuda.
A forma como ela disse aquilo, fez-me ficar com pele de galinha e pálida.
(...)
- Vá lá, Néné! Tu eras óptimo a Matemática. Faz 54860+20107 e divide esse resultado por 5.
- Mariza, estás doida ou quê? Estou cheio de sono, deixa-me dormir.
André estava muito, muito cansado, mas eu tinha um papel a cumprir: não o podia deixar dormir, pois podia ser fatal. A sua pele estava muito branca. Os seus olhos quase perderam o seu brilho.
- NÃO! Não podes! Olha, sabes quem está lá fora?
- Diga-me. – suspirando.
- O Espanhol.
- O QUÊ?! – exclamou ele, bem alto. – O Javi García está na sala de espera? Foi por causa daquele gajo que estou aqui!
- Pois, eu assisti a tudo, mas... ele não teve culpa, sabes?
- Ai não? Por acaso, estavas a ver o jogo? Viste o que ele me fez? Bolas, Mariza. Isso nem parece teu. Se não soubesse que não gostas dele até diria que o estás a defender.
- Não, nada disso, é só que...
- Hum-hum. Olha podes fazer-me um favor? Vais buscar-me um copo de água, se faz favor?
- Eu não devia, André.
- Estou cheio de sede.
Matutei um pouco.
- Está bem. Volto num instante.
Apressei-me até à máquina de água no corredor. Voltei ao quarto do André.
- Trouxe-te a água. – informei-o ao fechar a porta. Olhei para ele.
- André? – chamei-o ao vê-lo de olhos fechados. – ANDRÉ?!
Deixei cair o copo de água e comecei a gritar, junto à cama.
- André. André, por favor, não sejas invejoso e deixa-me ver esses olhos lindos!
Bati-lhe na cara, mas ele não reagia.
Pouco tempo depois, as enfermeiras ouviram os meus berros e entraram no quarto, mandando-me embora.
Voltei para a sala de espera, a chorar.
O Espanhol correu para mim e abraçou-me.
Pouco depois, a enfermeira de à pouco, voltou.
- O Sr. Santos entrou em estado de coma. Lamento.

- Mariza é melhor parares de beber!
- Porquê? – perguntei à Patrícia, enquanto me preparava para abrir a quarta cerveja. – A minha vida é uma merdae hoje o meu melhor amigo entrou em estado de coma.
- Yah. É preciso ter mesmo muito azar, fogo! No preciso momento em que o André ía marcar golo, o Javi García aparece e faz-lhe uma coisa daquelas.
- Mesmo. Eu também fiquei passadinha de todo, mas depois fui falar com ele e percebi que ele estava com problemas.
- O quê?! Falaste com ele? O que é que me andas a esconder, Mariza Ventura?
- Eu conheci-o.
Patrícia levantou as sobrancelhas.
- Tu. Conheces. O. Javi. García?
- Yap. – solucei. – É meu amigo, acho.
- OMG! – exclamou Patrícia. – E ainda dizer que tens uma vida de merda!
Rimo-nos.
Quando acabei de beber a sexta cerveja, Patrícia ajudou-me a levantar e levou-me atè casa. Para meu grande azar, a minha tia estava em casa.
- Boa noite, D. Madalena.
Boa noite, Patrícia. – disse a minha tia, serenamente, mas perdeu toda a sua calma, quando viu o meu corpo cambaleante ao lado da minha amiga.
- O que é que lhe aconteceu?! – berrou a minha tia.
- Nada de especial. A Mariza só precisa de descansar.
- Está completamente bêbeda, diz assim!
- Acha?! Não estou nada. – provocando a minha tia.
- Posso levá-la para o quarto?
- Sim-sim. Obrigada, Patrícia.
Fomos para o meu quarto. Estendi-me na cama.
- Mariza-Mariza. Como tu mudaste...
- As pessoas mudam, Tixa. É a vida.
- Pois, mas no teu caso, acho que nem o Diabo te reconheceria.
Ri-me.
- Adoro essa música.
- Hã?
Tirei o meu telemóvel do bolso e procurei na minha lista de músicas por Devil Wouldn’t Reconize You de Madonna. Começou a tocar; Patrícia abanou a cabeça.
- Amanhã vais à escola?
- Claro. Essa senhora está cheia de saudades minhas, tal como eu tenho saudades dela.
Patrícia olhou-me profundamente com os seus olhos castanho-esverdeados acusadores.
- Vê lá se melhoras, rapariga. – aconselhou ao sair do quarto.
Levantei-me e acendi um cigarro. Sentei-me em frente ao enorme espelho.
Afastei o fumo do rosto, pois atrapalhava-me a visão do rosto reflectido.
Os olhos daquele rosto estavam cansados; o nariz e as bochechas estavam mais rosadas do que o costume; o cabelo não estava brilhante e fluido; o corpo estavam mole e pouco equilibrado. Levei o cigarro à boca.
Seria a minha mãe capaz de me reconhecer?
Gostaria em quem a filha se tinha tornado?
Ficaria feliz? Ou desiludida?
Reconhecer-me-ía?
Enquanto acabava de fumar o cigarro, Madonna respondia: Even the Devil wouldn’t reconize you...

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